Há pessoas que não passam pela vida: elas a atravessam deixando música. Hely Drummond foi assim. Pianista de alma antiga e ouvido moderno, desses que não precisam de partitura para entender o coração de uma canção.
Conheci Hely no tempo em que o Madrigale ainda
buscava novas formas de dizer o que sentia através da música. Ele chegou com
seu piano, o humor mineiro e aquela sabedoria silenciosa de quem já viu o
palco, a noite, o rádio e o afeto passarem muitas vezes pela mesma tecla. Com
ele nasceu o espetáculo HelyElas... e nasceu também uma amizade.
Foram noites de ensaio e riso, canções que iam de
Tom Jobim a Johnny Alf, arranjos que traziam a sofisticação de quem sabia que a
beleza está no detalhe. Hely era o tipo de músico que acompanhava cantores como
quem conversa: escutando, respirando junto, deixando espaço para o outro
existir. Seus arranjos tinham algo de transparente. Eram como janelas abertas:
o ouvinte via a harmonia, sentia o balanço, mas o que realmente tocava vinha de
dentro. Sabiá, O Morro Não Tem Vez, Ilusão à Toa, Cantores
do Rádio, Chovendo na Roseira, todas essas músicas, depois que
passaram pelas mãos de Hely, nunca mais soaram iguais.
Ele tocava como quem acaricia o tempo. Era
generoso, firme e, ao mesmo tempo, brincalhão. Tinha esse dom raro de misturar
técnica e ternura. Quando acompanhava o Madrigale, parecia regê-lo com os
dedos: o som do piano era extensão da respiração do coro.
Nos bastidores, vinha o humor tranquilo, a história
contada em voz baixa, a ironia leve de quem sabia que a vida, como a música, é
feita de pausas e surpresas.
Hely partiu em 2022, mas ficou em tudo o que
criamos juntos. Ficou nos arranjos que ainda tocamos, nas vozes que ele
embalou, nas amizades que cultivou com paciência de artista e de amigo. Ficou,
sobretudo, em cada acorde que aprendeu a dizer o indizível.
Hely Drummond não foi apenas um músico do
Madrigale. Foi parte do nosso som. E, se é verdade que o som morre quando se
cala, então ele ainda não morreu, porque sua música continua ecoando em nós,
como um gesto de afeto e de eternidade.
Sua benção, Seu Hely.
🎧 (818) Carinhoso - Coro Madrigale (Hely Drummond) - YouTube