Um comentário que me chegou: não gosto dessas músicas dissonantes. Não posso me furtar:
Há muito se discute sobre o antagonismo entre consonância e dissonância, como se uma pudesse existir sem a outra. Desde os primeiros tratados sobre harmonia, aprendemos que a expressividade musical nasce do atrito o repouso e a tensão, o conforto e o desequilíbrio. A expressividade do barroco, por exemplo, não existiria sem a dissonância que traz o prazer da resolução.
Mas o que acontece quando ela não vem? Se a dissonância permanece suspensa, a música se torna inacabada? Ou ela apenas nos convida a escutar de outro modo, a aceitar o som como experiência aberta, onde o tempo e o silêncio ganham protagonismo? Isso é um problema?...
Na música coral, essa relação se manifesta de forma muito humana. Cada voz é uma linha independente, e a harmonia nasce do encontro entre diferenças. Consonância e dissonância convivem lado a lado como pessoas num mesmo grupo: às vezes se chocam, às vezes se abraçam, mas é desse movimento que surge a beleza do conjunto. A dissonância é o gesto que busca. A consonância, o que encontra. E entre ambas há um espaço precioso, o instante de escuta, onde a emoção acontece. Quando um coro canta, não há som puro que não se construa sobre alguma tensão. O acorde perfeito é resultado de pequenos desequilíbrios que se ajustam no ar, de respirações que se alinham por intuição e de intenções que se afinam mais pelo olhar do que pela nota.
Cantar em conjunto é aprender, a cada compasso, o valor da diferença e da escuta atenta. Por isso, pensar em música coral é pensar na vida. A dissonância não é inimiga da beleza, é o seu caminho. É ela que move o som, que cria o sentido, que transforma a emoção em matéria audível. Sem ela, tudo repousaria demais, e o repouso em excesso é o início do silêncio.
Um conselho: não tema o atrito. Ouça-o. Viva-o. É da dissonância que nasce o coro, e é nela que a música reencontra sua humanidade.
Aqui, uma dissonância/consonância branda: VOCES8 - Sigurbjörnsson: Heyr himna smiður
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