E aproveitando o post anterior, me permitam falar um pouco sobre o compositor e arranjador Marcos Leite (que fez os arranjos de Pra machucar meu coração e Lata d'água). Vamos lá:
Na minha opinião, poucos músicos transformaram o panorama do canto coral no Brasil como Marcos Leite (1953–2002). Compositor, arranjador e maestro carioca, ele uniu de forma pioneira a linguagem popular e o pensamento coral contemporâneo, criando uma estética própria, brasileira, ousada e sensível. Fundador do grupo vocal Garganta Profunda, Marcos deu nova dimensão à ideia de “coro”: não apenas um conjunto de vozes afinadas, mas um corpo expressivo, que canta, interpreta, respira e se move com teatralidade.
Sua escrita sempre valorizou o ritmo da fala, a pulsação da
música urbana, o humor e a delicadeza da canção brasileira. Ao mesmo tempo,
trouxe sofisticação harmônica e refinamento técnico, resultado de quem conhecia
profundamente a estrutura da música coral erudita, mas queria libertá-la do
peso do formalismo.
Foi ele quem mostrou que a música de Chico Buarque, Milton Nascimento, Gilberto Gil ou Gonzaguinha podia soar em quatro, seis, oito vozes, mantendo a emoção e a identidade brasileira com harmonias criativas e uma liberdade que convidava o público a redescobrir o conhecido.
Hoje, muito do que se faz em grupos vocais e coros populares no Brasil tem a marca de sua linguagem: a mistura de precisão e leveza, humor e lirismo, erudição e naturalidade.
Mesmo após sua partida precoce, em 2002, sua música continua viva, seja nos arranjos que seguem sendo cantados por coros de todo o país, seja na memória daqueles que o conheceram ou aprenderam com ele.
Enfim, falar de Marcos Leite é falar de um ponto de virada no canto coral brasileiro, mas também de uma inspiração pessoal. Como regente e educador, sempre admirei nele a coragem de dissolver fronteiras, de mostrar que a música popular pode ser trabalhada com o mesmo rigor, beleza e profundidade que qualquer obra do repertório erudito.
Marcos Leite ensinou que o coro é mais do que técnica, é presença,
alegria e partilha. E talvez o maior tributo que possamos prestar à sua memória
seja continuar cantando o Brasil, como ele fez: com harmonia, com inteligência
e com o coração.
🎧 Para ouvir: Hey
Jude (John Lennon/Paul McCartney) - Grupo Vocal Garganta Profunda
>
Nenhum comentário:
Postar um comentário