Entre tantas memórias fortes do Madrigale, a gravação ao vivo do Alleluia, de Randall Thompson, na Igreja da Boa Viagem em 2009, permanece uma das mais significativas. É uma peça que engana à primeira vista: um “Aleluia” que não exulta, não celebra, não louva.
Thompson escreveu essa obra em 1940, logo após a ocupação nazista da França, quando o futuro parecia incerto e sombrio. Encomendado por Serge Koussevitzky para ser uma fanfarra vocal de abertura do novo Berkshire Music Center, o compositor recusou a grandiosidade esperada. Seu gesto foi outro: oferecer uma oração. Ele afirmou que não conseguiria escrever nada festivo diante do que o mundo vivia naquele momento. O resultado é essa página lenta, meditativa, construída quase toda em dinâmica contida, como se cada acorde buscasse espaço para respirar.
Essa foi a minha busca constante no entendimento da interpretação da peça, e quando publicamos a gravação do Madrigale, alguns comentários chamaram atenção justamente por reconhecerem essa intenção original. Um deles dizia: “a única performance desta peça no YouTube no espírito lento e contemplativo que Thompson pretendia.” Outro acrescentava: “todas as performances de coros americanos passam voando por essa peça... esta é a primeira abordagem meditativa.”
Essas observações tocam num ponto importante: o Alleluia
não é um grito; é um recolhimento. É uma música que exige escuta e tempo. A
escolha por um andamento mais lento, mais refletido, não é um capricho
interpretativo, mas um retorno ao que Thompson expressou em cartas e
depoimentos sobre a obra.
Revisitar essa gravação hoje é lembrar que algumas músicas só revelam sua força quando renunciam ao brilho. O Alleluia é uma dessas. Não celebra a vitória; apenas sustenta a esperança: silenciosa, frágil, mas presente. E talvez seja por isso que essa interpretação, feita há tantos anos na Boa Viagem, ainda encontre ressonância. Porque, às vezes, aquilo que mais precisamos é justamente um Aleluia... que caminha devagar.
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