No Concerto de Música Sacra de 2009, a Ave Maria de Anton Bruckner ocupou um lugar especial no programa. Não apenas como obra de devoção, mas como um momento de recolhimento profundo, daqueles que organizam o silêncio da sala e o tempo interior de quem canta e de quem escuta.
A escrita de Bruckner é austera e delicada ao mesmo tempo. Não há ornamentos desnecessários, não há teatralidade. Tudo se constrói a partir de uma confiança quase absoluta no poder da harmonia lenta, das entradas cuidadas, da respiração comum. É uma música que não pressiona; ampara.
Em determinado ponto, justamente quando se nomeia o filho, Jesu, surge um forte, seguido da invocação Sancta Maria, como se ali o coro elevasse um clamor por proteção. O que vem depois, o ora pro nobis, retorna a um tom introspectivo e solene, quase como um recolhimento após o pedido. É como se, no cansaço, pedíssemos amparo a essa Mãe que nos observa de algum lugar e nos conduz, com delicadeza, para lugares melhores. Em Maria, Bruckner não convoca apenas a figura da mãe sagrada, mas algo mais amplo e profundamente humano: o arquétipo da mãe que protege, nutre, acolhe e cuida. A mãe como presença silenciosa, como porto seguro, como força que sustenta sem precisar se impor.
Às vésperas do Ano Novo, essa imagem ganha um peso especial. Depois de tudo o que atravessamos, individual e coletivamente, talvez seja disso que mais precisamos lembrar: do cuidado que não faz barulho, da proteção que não exige retorno, da ternura que permanece mesmo quando tudo parece instável.
Que esta música nos acompanhe neste dia 30 como um gesto de preparação interior. Para que o ano que se aproxima encontre em nós mais cuidado, mais escuta e mais capacidade de acolher, a nós mesmos e aos outros.
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