No post anterior, ao falar de D. Pedro de Cristo, encontrei no YouTube o vídeo que compartilhei e me chamou a atenção uma interpretação do Bando de Surunyo, grupo português dedicado à música antiga. A precisão, a naturalidade e a postura musical do grupo fizeram com que eu quisesse saber mais sobre eles.
Para acompanhar este post, deixo aqui um vídeo que considero
uma boa porta de entrada para quem nunca ouviu o grupo. É um madrigal belíssimo e a interpretação diz muito sobre a estética e o cuidado artístico do
ensemble:
O Bando de Surunyo é um ensemble português fundado em 2015, sob direção artística de Hugo Sanches, lutenista e pesquisador de música antiga. O nome vem de um vilancico (canções sacras ou devocionais com sabor popular, muitas vezes festivas) português do século XVII, “o bando de surunyo”, expressão que também alude a um bando de estorninhos, criando uma imagem de movimento, pluralidade e vozes em voo.
O grupo é especializado em repertório dos séculos XVI e XVII, sobretudo o repertório ibérico. Seu trabalho combina pesquisa histórica, leitura de manuscritos ou fac-símiles, interpretação informada pelas práticas da época e uma abordagem que integra palavra, corpo e som. O ensemble costuma trabalhar com formação vocal reduzida (geralmente 8 cantores) acompanhada por baixo contínuo (viola da gamba, tiorba, harpa ou outros instrumentos históricos), embora a formação varie conforme o programa.
O que primeiro me chamou a atenção no Bando de Surunyo foi a integração entre pesquisa e performance. Eles não tratam a música antiga como algo distante, reservado a especialistas. Ao contrário: colocam-na em cena com clareza, energia e naturalidade.
Outro aspecto marcante é a relação com o texto. Na música renascentista e no repertório português do século XVII, a palavra é o centro da experiência musical. O Surunyo trabalha isso com precisão: dicção clara, gestualidade contida e um sentido de fraseado que respeita a prosódia histórica. Além disso, o grupo tem um forte compromisso com o resgate do patrimônio português. Muitas obras apresentadas por eles são estreia moderna, peças que permaneciam adormecidas em arquivos e que voltam a soar graças ao estudo minucioso de manuscritos. Essa união entre rigor e frescor é rara.
O Surunyo não tenta “modernizar” o repertório; mas também não o congela. Eles o fazem respirar.
Penso que há algo de profundamente significativo em ver
jovens cantores e instrumentistas portugueses recriando, hoje, a música que
circulou nos claustros, igrejas e salões do século XVII. E ouvir o Bando de
Surunyo é, de certa forma, ouvir um fragmento do passado que se projeta no
presente, sem perder sua humanidade, sua vibração ou seu sentido.
Se você gosta de música coral polifônica, de repertório renascentista ou barroco, o trabalho do Surunyo é uma referência importante. Vale explorar os vilancicos portugueses, os motetos ibéricos, o repertório de transição entre Renascença e Barroco e as encenações que o grupo frequentemente realiza integrando música e corpo.
O Surunyo mostra que a música antiga não é um monumento, mas
é uma prática viva, feita de escolhas, de pesquisa e de sensibilidade. E, para
quem trabalha com coro, é sempre inspirador ver como esse repertório pode
ganhar vida com clareza, simplicidade e força artística.
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