terça-feira, 14 de outubro de 2025

The Making of the drums - 4. Gourds and Rattles (Cabaças e chocalhos)

Depois da pele, da madeira e dos bastões, chega o tempo da celebração. Em Gourds and Rattles, Bob Chilcott amplia o mundo sonoro da obra: agora, é a própria floresta que ressoa. As cabaças e os chocalhos entram em cena, instrumentos simples e ancestrais que carregam o som do tempo e da terra.

O poema de Kamau Brathwaite descreve a árvore de calabaça e a transformação de seus frutos verdes em instrumentos musicais. As folhas “não se chocam”, mas os frutos queimam “como cobre na luz” e racham para libertar as sementes que chacoalham. É uma imagem de renovação e movimento, a natureza se abrindo em som. O texto mistura serenidade e humor: as cabaças “fazem e zombam da nossa música”, como se lembrassem que a arte é também um jogo, um espelho da própria vida. A música, nesse ponto, deixa de ser apenas ritual e se torna festa.

Chilcott traduz isso com uma escrita coral cheia de energia e brilho. Há leveza no ritmo, estalos, sussurros, chocalhos vocais. O coro cria uma textura viva, feita de pequenas pulsações e respirações. É como se cada cantor segurasse uma cabaça invisível e a fizesse dançar no ar. Os ostinatos rítmicos mantêm o pulso contínuo, enquanto as harmonias saltam como sementes dentro do fruto. É um movimento que celebra a alegria da criação e a engenhosidade humana de transformar o que a natureza oferece em som e dança.

Aqui, o tambor já não é apenas instrumento, é comunidade. A música que começou no sacrifício termina em riso, corpo e movimento. Gourds and Rattles é a imagem da música em plenitude, o som que se liberta, o corpo que dança. Depois do silêncio e da reverência, vem o riso, a invenção, a vida. A obra termina como começou: com a natureza falando. Mas agora, ela fala cantando, e a canção é de todos.

Vou sugerir a audição da bela interpretação Taipei Chamber Singers, sob a regência de Yun-Hung Chen. Esta primeira peça vai do minuto 7:55 até 9:40. E amanhã eu falo sobre a quinta e última parte: The Gong-Gong.

🎧 https://youtu.be/wfFiHKXQ1dg?si=9Ko_lD_FSfIYcvdy&t=475


Gourds and Rattles

(Edward Kamau Brathwaite)

Calabash trees'

leaves

do not clash;

bear a green

Gourd, burn

copper in the

light, crack

open seeds

that rattle.

Blind underground the rat’s

dark saw-teeth bleed

the wet root, snap

its slow long drag of time,

its grit, its flavour; turn

the ripe leaves sour. Clash

rattle, sing gourd; never leave

time’s dancers weary like this tree

that makes and mocks our music.

 

Tradução livre:

As folhas das

árvores de calabaça

não se chocam;

dão uma cabaça

verde, queima como cobre

na luz, racham

sementes

que chacoalham.

Cego no subterrâneo, o escuro

do rato, dentes de serra,

sangra a raiz úmida, rompe

seu lento arrastar do tempo,

seu sabor áspero; torna

as folhas maduras azedas. Chacoalha,

canta, cabaça; nunca deixes

os dançarinos do tempo cansados como esta árvore,

que faz e zomba da nossa música.

 


 

 


 


 

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